domingo, 15 de maio de 2016

De costas

Em Figueira de Castelo Rodrigo
debateu-se, de novo, a interioridade



É uma preocupação recorrente com, norma geral, receitas para a resolução baseadas em subsídios, apoios e maior investimento, aquela que, uma vez mais, foi debatida na pequena Figueira de Castelo Rodrigo. A interioridade. A necessidade de fixar população e aproximar os níveis de desenvolvimento dos existentes no litoral, foram conversados para terminar com um pedido: criar um plano de emergência capaz capaz de inverter o cenário de abandono e desertificação.

Há uns anos, a apresentação de um novo modelo da Peugeot levou-me, por 24 horas, à Sardenha. Por entre várias actividades milimetricamente planeadas, constou um jantar de convívio onde tive a sorte de me sentar ao lado de um octagenário descendente de Armand Peugeot que, confesso, não recordo o nome. A conversa acabou por fugir à enfadonha, confessou-me ele, história de família ou carros. O senhor Peugeot, chamemos-lhe assim, mesmo que tenha a certeza que o apelido havia-se perdido sem ter chegado ao seu nome, conhecia muito bem Portugal. Gostava, como todos gostam. Mas depressa explicou que era um país que nunca entendera muito bem.
"Passam demasiado tempo voltados para o mar, a olhar o horizonte, e isso atrasa-vos", considerou Peugeot. Os habituais argumentos de uma zona marítima potencialmente rica e a possibilidade de explorar este recurso não o comoveu, pelo contrário. Para o senhor Peugeot, estarmos voltados para o mar era o nosso defeito. "Deviam voltar-se para Espanha, dar as costas ao mar e olhar para onde existe gente", retorquiu. Na prática, aquilo que me dizia era que o actual litoral deveria ser o interior e as zonas em desenvolvimento deveriam estar próximas da fronteira, o mais próximas possível do resto da Europa. Aceitando a lógica de Peugeot, a Guarda seria mais apetecível do que o Porto, Bragança mais explorada que Lisboa.
Não me esqueci da posição de Peugeot e, friamente, esquecendo a melancolia de olhar para o mar como algo que nos corre no sangue, acabei por juntar-me a ele nessa opinião. O Atlântico deu-nos o passado e mantém-se como eterno futuro, já a Europa é o presente e a proximidade ao resto do nosso mundo, aquele de quem estamos sempre a falar mas apenas vemos... pelas costas.
Não terá, provavelmente, sido coincidência que a Peugeot Portugal (PSA) tenha escolhido Mangualde para instalar uma unidade de produção. Mangualde é, claramente, o equilíbrio entre o senhor Peugeot e o português, como eu, ou seja, fica a meio caminho do mar e de Espanha.

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