quarta-feira, 27 de abril de 2016

d'Orpheu

Nunca gostei do Mário.
Mas talvez esta seja uma declaração exagerada



O primeiro poema que li, teria uns 14 anos, foi de Almada Negreiros. Desde aí, um dos mais relevantes elementos do movimento futurista, ou modernista, no nosso país entrou-me no corpo e fez mossa até hoje. Permanece como a minha maior influência, é nascente de tudo o que se seguiu e, por arrasto, levou-me diretamente à sua obra e aos poetas d'Orpheu. Depressa dei por mim a ler toda a obra publicada de Almada Negreiros e viajar até Mário Sá Carneiro e, mais tarde, a entrar no Mundo de Fernando Pessoa. Curiosamente, nunca os consegui verdadeiramente separar, sempre os olhei individualmente mas à luz da revista Orpheu. Sem querer, puto como era, estava longe de perceber que, na verdade, eram mesmo inseparáveis. A poesia de Almada nunca foi, não fosse ela futurista, suave e líquida como a de Sá Carneiro ou Fernando Pessoa mas, talvez por isso, tenha sido importante encontrá-lo antes de tudo.

Serviu, esta entrada, para, de alguma forma, justificar a importância que teria que dar à exposição que decorre em Paredes de Coura - sim o Alto Minho tem uma intensa e interessante actividade cultural que não sobressai mais porque, enfim, centralismos - fundamentada nos 100 anos da morte de Mário de Sá Carneiro e que traça a profunda ligação entre Pessoa e Sá Carneiro. É correspondência trocada entre os dois e a visão clara das influências mútuas que, lá está, ficaram visíveis na revista Orpheu, por exemplo. Aqui Almada é um espectador. Ainda assim, trata-se de uma mostra comovente e imperdível pelo mais profundo sentir de dois dos mais importantes poetas portugueses de sempre.



Um grande, grande adeus do seu pobre Mário de Sá-Carneiro”.

Lê-se num bilhete amarelecido, de letra irregular, escrito e dirigido a Pessoa, momentos antes do suicídio do autor, em Paris. Lê-lo aqui arrepia, lido no manuscrito, presente na exposição, provocará o choro aos mais sensíveis.
"Mil Anos Me Separam de Amanhã", assim se chama a exposição, decorre num parque de estacionamento, assim, sem mais, sem mordomias ou mariquices, porque os d'Orpheu, sempre as dispensaram. Venham de lá esses vícios.



Fim

Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!

Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.

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